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Glee – 10 motivos para dar uma chance à série

Quando ouvi falar a primeira vez sobre Glee, logo torci no nariz. Série adolescente, musical, toda coloridinha? Um High School Musical com mais hype? Afinal, é série de mulherzinha, viadinho, frescura total. Nem a pau coloco os olhos sobre isso.

E assim fui levando minha vida de seriados, sempre mantendo a série na minha lista de vetos. E ai de quem eu soubesse que assistia. Zoação eterna na sua vida.


Pois eis que um dia, por um motivo qualquer, eu vi um dos musicais de Glee, separado, fora de contexto. Me chamou a atenção. Me causou curiosidade. E, mesmo titubeante, cogitei a possibilidade de assisti-la. E, em uma chuvosa tarde de sábado, fui à locadora do Ultra e peguei o episódio de Glee referente à cena musical que eu havia assistido.

Muito cético, minha “aversão” prematura a série foi desabando a cada minuto.

O que eu via era algo que há muito não tinha visto na TV. Uma série que tem peito pra pegar todos os paradigmas sociais, esfregá-los na sua cara e fazer graça disso.

Sem deixar o romance de lado, claro, pois há adolescentes, Glee tem conteúdo. E é por isso que eu listei 10 motivos para que você não olhe torto pra Glee. E quem sabe, dê uma chance a ela.

10 – O Non-Sense encontra o realismo

As situações de Glee são um retrato do cotidiano. Ou melhor, uma caricatura. Todas as situações são levadas ao bizarro. Um exemplo é quando os garotos, para poderem, digamos, “paumolecer” em situações que possam trazer embaraço frente às garotas, chegam à conclusão que basta pensar na treinadora do time de futebol do colégio, Beiste. Mas ao murmurar o nome da treinadora durante um amassado com a namorada (pois estava realizando o exercício de relaxar o palhaço), Sam acaba dando a entender que tem um caso com ela, que passa a ser acusada de pedofilia.

9 – O Ritmo dos episódios

Glee tem uma edição rápida, porém não besta. Se Malhação tenta ser modernosa desde o dia que estreou, e tudo que consegue é causar uma bela vergonha alheia, Glee traz cortes rápidos de cena e diálogos tão ágeis quanto afiados. Preste atenção, pois você pode perder um comentário ácido e extremamente pertinente que é jogado na sua cara sem você sequer notar.

8 – O elenco jovem

O jovem elenco do seriado me passa uma coisa engraçada. Não sei se eles são bons intérpretes ou se o roteiro que faz isso. Mas eles me passam verdade. Não consigo dissociar os atores e os personagens porque eles parecem muito reais, mesmo quando são elevados a enésima potência da estigmatização – esta totalmente intencional e com um propósito. E quanto à qualidade visual, sem comentários. Temos desde a beleza nhui de Quin a gostosura latina de Santanna. Vale a olhada.

7 – A Originalidade

Séries adolescentes saem aos bortobotões. Todo o ano trocentas seriados voltados a esse publico estréiam, muitos morrem na praia. Mas se reclamam muito hoje em dia da qualidade dos roteiros de Gossip Girl e 90210, que baseiam toda o seu foco praticamente nas idas e vindas dos casaizinhos, Glee se destaca. Um professor que quer fazer com que o coral do colégio seja algo popular e recruta um grupo de pseudo cantores extremamente disfuncional.

6 – Sue Silvester

A vilã da trama, treinadora das cheerleaders, é o bullying em pessoa. Inferniza o professor Will e todos os integrantes do Glee sempre que pode. Mas, assim como nenhum personagem da série, ela não é unidimensional. Sue é o exagero nas maldades, caricata, quase um desenho animado. Mas quando conhecemos seu lado humano – exemplificado na irmã com síndrome de down, da qual ela trata com o maior carinho do mundo e a trata como igual – ou quando ela se deixa comover pelo sofrimento de Kurt, por crianças com câncer ou mesmo pela mensagem de tolerância religiosa que vemos em um dos episódios, entendemos que mesmo o mais cruel ser humano pode ser bom.

5 – Chutando paradigmas e o politicamente correto

Episódio na semana de prevenção ao consumo de álcool? Que tal todas as musicas do episódio serem sobre festas e bebidas, e praticamente todos os personagens ficando bêbados? E nada de final com lição de moral pra traumatizar. Uma vomitada no palco, uma ressaca brava e a frase: “Não adianta tentar convencer adolescentes a não beber. Só podemos mostrar a eles o que a bebida causa eventualmente, e deixar a eles a decisão.” Ou um episódio que simplesmente zoa com os clubes de castidade americanos, bem como o pensamento retrógrado de que o melhor a fazer para manter os jovens seguros sexualmente é não falar sobre sexo com eles. Isso sem falar nos próprios personagens que são um pé no saco dos paradigmas estabelecidos.

4 – Os personagens

Um quarterback galã, virgem e tapado. Uma garota judia, pudica e arrogante. Um garoto gay, afetado e culto. Uma garota negra e obesa. Um bad boy preconceituoso, marginal e arruaceiro, garoto pobre da periferia. Um cadeirante cheio de medos. Uma garota loira, linda, manipuladora, religiosa e casta. Outra loira gostosa, e burra como uma porta. Outra latina, devassa e cruel. Sim, todos os personagens são estereótipos, praticamente. E fortes estereótipos. Visíveis, algumas vezes muito caricatos. Eles servem como voz a conhecermos o diferente a nós – e a eles. Sim, pois as diferenças ali ficam claras quando notamos que todos eles são diferentes em diversos aspectos – cultural, religioso, afetivo, físico. E sim, o relacionamento entre pessoas tão diversas é difícil. Mas é nestes estigmas sociais que se tornam próximos é que notamos o quanto somos diferentes e iguais. Porem o politicamente correto passa longe. Kurt sofre homofobia de forma em muitas vezes até engraçada. A obesidade de Mercedes é esfregada na sua cara pelo estilo de vida da garota. Artie não é tratado como um coitadinho por ser cadeirante – sua situação muitas vezes utilizada como forma de humor. Tudo, claro, com talento, sem cair no mau gosto. O humor utilizado na sua concepção de esfregar a realidade na sua cara, fazer graça disso, deixar um pensamento atrás da sua orelha. E unir ao brincar junto, ao invés de segmentar.

3 – A forma leve com que trabalha a polemica

Bullying, homossexualidade, deficiências físicas, etnias. Religião. Tudo é tratado com humor, leveza e ao mesmo tempo, uma profundidade que raramente é vista. Nada é panfletário ou didático. Não se levantam bandeiras, se levantam idéias. Exemplo. Em um episodio o pai de Kurt fica entre a vida e a morte. No anseio de ajudar o amigo, o grupo passa a cantar musicas religiosas no intuito de trazer a ele esperança. Mas Kurt se revela ateu. Ao mesmo tempo em que ele demonstra certa arrogância quanto ás crenças dos amigos – sejam eles judeus ou cristãos, como fica dividido no episodio – os amigos religiosos tentam convencê-lo de que Deus existe ao acharem absurdo o pensamento do garoto. Quando questionado de porque não acreditar em Deus, Kurt exemplifica: “Se Deus existe, ele me fez. Então ele me fez gay. E fez centenas de pessoas que seguem as religiões dele e que me atacam por acharem que ser como eu sou foi uma opção minha.” O episodio não dá vencedores. Ninguém converte Kurt, Kurt não desconverte ninguém. Mas todos param pra pensar – principalmente o espectador. O que vence? O livre arbítrio e o direito de pensar individual. Raramente se vê um tema espinhoso como religião debatido com acidez, verdade e sem, como já disse, panfletarismo.

2 – Os musicais

Sim, os musicais. Ao fim do episodio que citei sobre religião, o clube canta “What If God Was One Of Us”. A letra tem tudo a ver com a trama. E se Deus fosse um de nós? Quando o pai de Kurt está entre a vida e a morte, ele canta “I Want to Hold Your Hand” dos Beatles, em uma versão diferente. Tudo a ver, pois quando a mãe dele morreu o pai não disse nada, apenas apertou sua mão mostrando que estaria ali sempre.

No episodio de dia dos Namorados é interpretado “Silly Love Songs” de Paul McCartney, muito bom. Santanna canta “Landslide” como uma declaração secreta de amor em outro episodio, centrado no tema sexo. Isso sem contar as que são apenas para divertir, como quando Gwyneth Paltrow, pra mostrar que era “descolada” manda um “Forget You” do Cee-Lo pra galera.

1 – Porque você pode dar uma chance àquilo que lhe é inicialmente estranho

Glee fala sobre bullying e preconceito, e de certa forma, sofre esse mesmo preconceito por parte da audiência. Uma metalinguagem, talvez involuntária. Mas que funciona. O seriado é, dentro do universo televisivo, um Kurt, uma Mercedes, uma Rachel. Glee, apesar de já Cult, recebe de quem não tem informação sobre ela, copos de raspadinhas sem ter feito nada. Não dê uma chance apenas de conhecer Glee antes de julgar. Conheça. Conheça e respeite.

Dar a chance a si mesmo de conhecer quem é diferente não é um favor que você faz para o outro. O coral da escola está muito bem e não precisa do seu aval para existir e ter sucesso.

É um favor que você faz a si mesmo. De conhecer o que está fora da sua zona de conforto.

E quem sabe seja mais um a aprender que independente de cor, origem, crença, nacionalidade, orientação sexual, status social, condição física ou mental, altura, peso, filosofia, cor do lho, quantidade de cabelo ou qualquer outra coisa, ninguém é melhor do que ninguém.

Até o próximo episódio.

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