Uaréva! Moura,Moura em Série,Seriados 10 séries que perderam seu protagonista – Nº 5: Two and a Half Men

10 séries que perderam seu protagonista – Nº 5: Two and a Half Men


Ontem falei sobre como a entrada de Charlie Sheen, substituindo Michael J Fox na série Spin City acabou tendo um resultado melhor do que o esperado pela produção.

Isso não deixa de ser irônico, sendo que anos depois foi o próprio ator que, devido aos problemas de seu temperamento, precisou ser retirado de uma série feita praticamente sob medida para ele.

Como vou falar sobre coisas que acontecem muito à frente em todas as séries, já deixo avisado que é impossível evitar os SPOILERS.

Nº 5: Two and a Half Men

O final de Spin City e o sucesso que o personagem Charlie Crawford alcançou na série, emulando boa parte da personalidade de seu homônimo intérprete, Charlie Sheen, marcou a entrada definitiva do ator, até então com uma carreira no cinema (Platoon, Wall Street, Top Gang…), para o mundo da televisão.

Dessa forma, em 2003, o produtor e criador da série, Chuck Lorre, convidou Sheen para protagonizar a série Two and a Half Men, ou Dois Homens e Meio no SBT. Assim como em seu papel anterior, Sheen volta a interpretar um personagem que herda seu verdadeiro nome e também os hábitos pelos quais o ator era conhecido. Assim nasceu o bon-vivant Charlie Harper, um escritor de jingles rico. Hedonista, a vida de Charlie se resume a beber, fumar, usar drogas, jogar e transar com o máximo possível de mulheres, tudo isso em sua confortável casa na beira da praia, em Malibu.

A vida de Charlie fica mais complicada quando seu irmão, Alan Harper, se divorcia e pede abrigo em sua casa, vivido por Jon Cryer, coincidentemente, um dos atores cogitados para substituir Michael J Fox em Spin City antes de Sheen. Junto com Alan, um quiroprata inteligente, porém sempre azarado e bastante loser, vem um mundo de incomodações para Charlie. Uma delas é Jake, o filho de Alan, que serve como o “Half Man” do título. Outra é Judith, sua ex-mulher mesquinha e egoísta. Completam o elenco inicial a empregada Bertha e Emily, a matriarca dos Harper.

Durante as oito primeiras temporadas, a série segue com uma dinâmica bastante parecida, sempre as voltas com as conquistas sexuais de Charlie, fazendo uma contraposição às desventuras de Alan, que sempre acaba tendo uma derrota patética e hilária no que tenta fazer. Enquanto Charlie coleciona beldades em sua cama, com alguns raros casos de envolvimento mais profundo, como aconteceu com a Chelsea nas temporadas seis e sete; Alan coleciona situações embaraçosas e frustrações românticas, sempre tendo que lidar com os problemas do filho e a implicância da ex-mulher.

Two and a Half Men era um sucesso, tinha um público cativo e fãs bastante satisfeitos com a série. Tudo ia bem né?

Até que…

Com o tempo o ator perdeu o controle, caindo profundamente no álcool e as drogas. Pra valer e com vontade. Os problemas do ator levaram a produção a pausar as gravações do programa em 2010, para que ele pudesse ir para uma clínica de reabilitação. As portas do inferno haviam sido abertas.

As filmagens foram retomadas, mas Sheen começou a anunciar que sairia do programa. O salário do ator na época era de um milhão de doletas por episódio, e ele estava recusando aceitar esse valor para renovar seu contrato. (Drogas são caras). Negociações lá e cá entre a emissora e o ator acabaram fechando em um contrato de mais duas temporadas, com um salário de quase um milhão e oitocentos mil dólares por episódio.

Porém, mesmo com mais dinheiro caindo na conta, Sheen não conseguiu sossegar o faixo. Em praticamente um ano ele se internou três vezes em rehabs, o que prejudicava imensamente toda a produção. Two and a Half Men foi novamente colocada em hiato, indefinidamente, por conta dos problemas pessoais do ator.

Os bastidores começaram a ficar bastante conturbados por conta disso tudo. Sheen foi a um programa de rádio e deu uma entrevista ao TMZ detonando a série e seu autor/criador, Chuck Lorre. Charlie Sheen atacava Lorre sem piedade, demonstrando uma arrogância bastante visível. Ele tinha certeza que Two and a Half Men só havia alcançado o sucesso graças a sua atuação, que Lorre o estava explorando, que o novo valor fechado de seu contrato – aqueles mesmos quase dois milhões – eram pouco frente ao sucesso que a série tinha graças a sua presença como protagonista.

Isso levou a produção, emissora e o próprio Lorre a fecharem um novo acordo com Charlie Sheen.

Eles entravam com o pé, Sheen com a bunda.

A sumária demissão do ator levou a suspensão da produção da oitava temporada, parando no décimo sexto episódio.

E como resolver essa situação? Ao contrário dos demais casos citados anteriormente nessa serie de posts, em que mesmo demissões foram resolvidas com alguma diplomacia, dando a chance dos personagens terem seus encerramentos de arcos, o rompimento Lorre/Sheen foi bem abrupto e intempestivo, deixando pouca margem para um diálogo entre as partes que permitisse um acordo para dar um fim digno a Charlie Harper.

Mas, por forças dos deuses das sitcons, o ultimo episódio com a presença do irmão mais velho de Alan encerra exatamente com o mulherengo indo viajar para Paris com sua apaixonada stalker, Rose.

Com um bom tempo para repensar a série e a melhor forma de resolver o problema, nomes como Jeremy Piven, John Stamos e Rob Lowe foram cogitados para fazer a substituição. Mas o único que realmente foi contatado oficialmente foi o britânico Hugh Grant, que não aceitou porque, segundo ele, os caras chegaram oferecendo a proposta sem nem mesmo ter um roteiro ou um personagem criado.

Foi assim que Ashton Kutcher, o eterno Kelso, acabou dando um tempo em suas tentativas de emplacar no cinema e se tornou Walden Schmidt.

A nona temporada da série começa com o velório de Charlie. Alan começa discursando sobre o irmão, com um roteiro que faz questão de zoar muito Sheen, reunindo boa parte do elenco que passou pelo programa.

Melhor do que eu explicar é melhor dar play na cena.

https://www.youtube.com/watch?v=G1IjCh51gHg

Com a casa de Malibu a venda, Alan e Emily passam a receber possíveis compradores, entre eles participações especiais, como o próprio John Stamos e um crossover com Dharma e Greg, do seriado homônimo.

Até que no meio da madrugada, um homem aparece na varanda da casa, assustando Alan, que está se despedindo das cinzas cremadas do irmão. É Walden, solicitando usar o telefone, depois de uma tentativa frustrada de se suicidar afogado no mar. Deprimido por conta do divórcio, Walden já se mostra muito diferente de Charlie. Completamente, apaixonado pela ex-mulher e sem interesse por outras mulheres que não ela, ele logo deixa escapar para Alan que é um bilionário.

Essa rápida interação entre os dois acaba iniciando uma amizade, de forma bastante inusitada (e talvez forçada).

Você pode ler um review mais completo do episódio de estreia de Walden aqui

Obviamente, Walden se torna o comprador da casa. Alan se toca rapidamente que o bilionário é um cara muito infantil, não sabe se virar sozinho e parece ter menos aptidão social que o próprio Harper sobrevivente. Dessa forma ele passa a ajudar o novo amigo na sua tentativa de reatar o relacionamento com a ex, ganhando assim novamente um lugar na casa de Malibu, dividindo com Schmidt.

Como citado, Walden é bem diferente de Charlie, mas a série tem problemas em estabelecer realmente sua personalidade. Inicialmente ele é depressivo e inseguro, causando indignação ao Alan, devido a sua inteligência, bela aparência física e atributos privilegiados (sério, o roteiro insiste em falar do tamanho da trozoba do Walden com mais frequência do que é aceitável).

Dessa forma o novo personagem não conseguiu cativar nem um pouco a audiência, principalmente se comparado ao seu predecessor. E é assim que Charlie volta para a série.

Não, não Charlie Sheen. Esse continua sendo persona non-grata. Mas a sombra do Harper mais velho começa a se tornar cada vez mais presente, com vários plots baseados no legado dele. Em um episódio, por exemplo, Alan passa a se comportar como o irmão mais velho, até mesmo acreditando ser ele. Em outro, Kathy Bates surge como o fantasma do falecido Charlie para conversar com Alan.

Como o personagem Walden não consegue engrenar muito, Alan acaba tomando para si naturalmente o protagonismo, e outros personagens se tornam recorrentes na série: Lindsay, a namorada de Alan, ganha mais espaço, assim como seu filho Eldrige, que faz uma parceria meio chata com o agora adolescente Jake; Bridget, a ex de Walden se torna recorrente; e surge Zoey, o novo interesse amoroso do personagem de Kutcher.

O inicio da decima temporada marca algumas mudanças na série. Jake, que já estava tendo pouca utilidade nos roteiros, vai para o exército e suas participações, mesmo estando no elenco fixo, passam a ser mais espaçadas. E, enquanto Alan continua sendo o protagonista de fato, o roteiro ainda busca adequar o personagem Walden para que ele se torne interessante. Ele vai de romântico apaixonado, a desiludido amoroso, até se tornar mulherengo e boy toy de mulheres mais velhas, voltando novamente a ser um romântico depois. Incluem um plot de que ele está cansado das pessoas se aproximarem dele apenas por interesse também.

Aliás, os plots vão ficando cada vez mais “pesados”. A amizade de Walden e Alan leva o relacionamento deles até limites que a relação dos irmãos Harper não chegava, com direito até um ménage e com cada um dos protagonistas acabarem transando com a mãe do outro.

Mas é no final da temporada 10 que a série perde seu segundo “meio” protagonista. Angus T. Jones, o Jake, entrou para a Igreja Adventista do Sétimo Dia, e se desligou da série. O jovem ator passou a afirmar que o programa era sujo, e pediu aos seus fãs que parassem de assistir Two and a Half Men. Na série, seu personagem se mudou para o Japão.

“Quando você é uma criança bonita você se transforma num adulto esquisito.” 

Novamente Chuck Lorre precisou arrumar uma saída para a próxima temporada. Claro que a serie poderia continuar apenar com Alan e Walden, mas o título é Dois Homens e Meio.

É disso que nasce uma das ideias mais de jerico que o programa apresentou: Jenny Harper. Provando que a série não consegue se desvencilhar do seu antigo protagonista, bate a porta da casa de Malibu uma jovem aspirante à atriz que busca pelo pai, Charlie. Eles jamais se conheceram, mas o falecido Harper sabia de sua existência, bancando a garota até sua morte. Jenny emula toda a personalidade de Charlie – bebidas, jogos e mulheres (Jenny é lésbica). Tomando o espaço que seria de Jake, ela também passa a morar na casa com Walden e Alan.

Jenny dura toda a décima primeira temporada, mas aí ninguém mais se importava muito para o programa, e sua repercussão foi tão pequena que poucos se lembram da existência da personagem. A prova disso é que na décima segunda, a temporada derradeira de Two and a Half Men, a filha de Charlie Harper aparece apenas em três episódios, mesmo tendo sido elencada como o novo “half man” da anterior.

O plot da última temporada envolve Walden decidido a ter um filho, e para isso ele propõe que ele e Alan se casem (mesmo sendo heteros) e adotem uma criança, introduzindo um novo half men, no caso o filho adotivo da dupla. Isso teoricamente fecharia um ciclo, encerrando a série como ela começou: dois homens trabalhando juntos para criar uma criança.

Charlie Sheen começou então uma campanha para que seu personagem retornasse para a series finale. Há várias versões para o fato não ter se realizado. Uma delas diz que Sheen não gostou da piada final que envolveria seu personagem, o uso de drogas, sua histeria de ataques contra Lorre e sua arrogância. Mas o mais provável mesmo é que Chuck Lorre tenha simplesmente vetado.

O episódio final traz Jake de volta em uma participação, envolve a possibilidade de o Charlie estar vivo e faz inúmeras piadas sobre a longevidade desnecessária que o programa teve, com metalinguagem até demais. Ela realmente encerra com o retorno do Harper mais velho, porém interpretado por um duble que aparece apenas de costas, para ser atingido por um surreal piano que cai do céu.

E assim encerrou uma das mais longevas sitcons da televisão, após 12 anos de exibição, mostrando que, se você não tiver uma boa ideia para continuar uma história… Não há vergonha nenhuma em parar.

E Charlie Sheen? Bom, como passar vergonha pouca é bobagem, o ex-astro que agora se diz na lista negra de Hollywood após todo esse barraco que protagonizou, está tentando a todo custo conseguir um revival de Two and a Half Men…

Amanhã é sexta, tem a segunda parte do especial 300 do Podcast Uaréva! Então, segunda-feira tem mais um dossiê sobre outra série que perdeu seu protagonista.
Até o próximo episódio!

Designer gráfico por vocação, publicitário por formação, filósofo por piração.

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