Uaréview
Por Marcelo Soares
Sempre gosto quando um filme me faz sentir que realmente o que estou vendo é cinema e não um simples amontoado de imagens coladas sem sentido. Cinema é algo, pelo menos para mim, que passa um sentido além do óbvio, do simples, seja no uso de uma cor, de uma fala ou pequenos gestos que mostram o poder que a imagem – arma principal da sétima arte – não está ali só por estar. Alguns filmes nacionais nos últimos tempos tem me dado o prazer de ver que em nosso país ainda existem narradores de ficção que sabem o que fazer com a ferramenta cinema, e um desses filmes foi exatamente o tema de hoje: É Proibido Fumar.
O filme da diretora e roteirista Anna Muylaert conta a história de Baby (Glória Pires), mulher solteira que vive sozinha no apartamento que herdou da mãe. Ela dá aulas de violão para alguns alunos e vive em atrito com as irmãs. Quando o músico Max (Paulo Miklos) se muda para o apartamento vizinho, Baby vê nele a grande chance de voltar à vida. Para que o romance dê certo ela está disposta a enfrentar qualquer ameaça, inclusive seu vício compulsivo por fumar. Aliás, a questão do cigarro a primeira vista pode parecer como um discurso antitabagismo, porém, é mais uma metáfora para a psique da personagem de Gloria Pires do que um acessório sociológico.
No cigarro nas mãos, estão depositados todas as inseguranças, desesperanças, comodidades e falta de vida de Baby, alguém apegado a mãe falecida e a um desejo que nunca cumpriu de viver a vida e ser feliz. Em seu encontro com Max, e no sopro de vida que ele lhe dá, a primeira atitude da personagem é buscar largar o fumo em prol de uma vivencia nova e sem conflitos. Porém, na primeira duvida e angústia a ânsia de fumar retorna e a empurra para o caminho final de sua história.
É Proibido fumar é um filme sobre pessoas comuns, em vidas comuns, com problemas comuns, que se cruzam e tornam algo ordinário em especial, diferente. Muylaert mostra bem isso em sua direção, mostrando ângulos ao mesmo tempo tão simples e óbvios até e ao mesmo tempo diferentes, como a cena de uma conversa de Baby com sua irmã onde as vemos por uma fresta de janela ou ainda o dançar de pernas ao redor de uma mesa de centro em uma discursão de Max e Baby, mostrando bem a confusão e desordem de pensamentos dos dois no momento. Sutileza e sensibilidade, talvez seja como podemos definir o cinema de Muylaert.
Outro ponto positivo do filme é sua ambientação. Em um mercado cinematográfico recheado de obras históricas, favelísticas ou de regionalistas, bom ver uma que trata da urbanidade comum pelo menos a boa parte das capitais brasileiras, com seus problemas, encontros e desencontros típicos. Seguindo a linha de
Chega de Saudade e
As Melhores Coisas do Mundo, ambos de
Laís Bodansky, É Proibido Fumar se finca como um dos filmes que procura ver além do cotidiano de uma grande cidade, observar com suas lentes a angustia e sonhos de pessoas como você, eu e tantas outras que nos deparamos ao andar por aí.
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