Doutor Oculto

“Olhe atrás de você, criança.

Nós já deixamos seu mundo.

Este portão emadeirado existe em ambos os mundos – aqui e lá.

Há muitos lugares comuns a mais de um plano, acessível àqueles que conhecem o caminho a ser trilhado.”

Doutor Oculto



Tema Macabro

A maioria de vocês talvez nunca tenha parado para pensar nisso, mas já imaginaram como era a vida sem televisão? Atualmente, mesmo com a Internet crescendo em progressão geométrica, podemos dizer que a TV ainda exerce muita influência social, sendo de fonte de notícias a ferramenta de entretenimento. E entretenimento é o que mais temos na TV hoje em dia. Parte do entretenimento estão nas histórias seriadas, que aqui no Brasil tem pouca aceitação em caso de produtos nacionais (até porque o público geral prefere os folhetins), mas que têm grande aceitação entre os produtos americanos, principalmente. E os americanos são especialistas em produzir séries de TV.

Mas não é sobre as séries de TV que vamos falar, e sim de histórias em quadrinhos. Mas porque então falei sobre a TV e as histórias seriadas? Lembram o que eu perguntei no começo? Imaginem como era a vida antes da televisão. A vida não era muito diferente, apenas as notícias não chegavam até nós em tempo real e o que víamos na TV era aquilo que líamos impresso, ou seja, notícias líamos nos jornais, e para histórias seriadas líamos histórias em quadrinhos.

Entre o fim do século XIX e a metade do século XX, a produção de quadrinhos americana contava, em grande parte com histórias que mais tarde foram conhecidas como “Pulp”. Este termo descrevia quadrinhos seriados de aventura e ficção, de entretenimento fácil e leitura rápida, histórias sem pretensões artísticas ou intelectuais, mas que garantiam a diversão dos leitores. Em termos de formato, podemos dizer que os Pulps eram o “primo rico” dos fanzines, quadrinhos produzidos de forma rápida, com histórias curtas e impressos em papel barato, geralmente com capa colorida e miolo preto e branco. Guardadas as devidas proporções, os quadrinhos Pulp representavam para uma sociedade sem televisão o que as séries atualmente representam para nossa sociedade.

O surgimento do Superman, na revista Action Comics nº 1 marcou o início da transição da era Pulp para a Era dos Super-Heróis e, durante esse período, havia muito pouca distinção de gênero entre as histórias, pois ambos os estilos compartilhavam diversos elementos, uma vez que os supers não são outra coisa a não ser “descendentes” dos heróis das revistas Pulp.

Neste cenário, surgia, em 1935 (antes do Superman), um personagem que pode ser considerado o “elo perdido” que liga as ficções Pulp e as histórias de Super-herói: Doutor Oculto.

Criado na edição número 6 da revista More Fun Comics, Doutor Oculto, também conhecido como “O Detetive Fantasma” era um investigador particular com poderes sobrenaturais com visual típico das histórias noir, que tratava de resolver casos envolvendo o paranormal, o místico e o sobrenatural. Eventualmente, o detetive passaria a contar com uma parceira, chamada Rose Psychic.

Como a grande maioria das histórias da época, não havia muita preocupação em mostrar sua origem, e sim estabelecer o personagem no seu presente e mostrando-o a cada mês investigando um caso sobrenatural diferente (num formato semelhante a muitas séries de TV de antigamente, como Carl Kolchak, jornalista e personagem da série homônima que inspirou mais tarde a série de TV Arquivo X), então muito pouco se sabe hoje sobre as origens oficiais do personagem.

E teria continuado assim se o personagem não tivesse sido resgatado nos anos 80, na revista All-Star Squadron, uma hq de equipe que se passava durante a Segunda Guerra. Na revista, a origem do personagem foi finalmente contada, usando-se de um retcon (atualização ou modificação de informações no passado dos personagens), mostrando que Oculto e Rose eram irmãos que, quando crianças foram oferecidos como sacrifício a Satã por um culto místico em algum ponto do ano de 1889. Algo no ritual deu errado e o demônio invocado foi, ao invés de Satã, Koth, uma criatura que não se alimentava de almas puras, e sim corruptas. Assim, ele eliminou todos os membros do Culto enquanto os dois irmãos foram resgatados por um homem chamado Zator e levados para uma cidadela que era lar de uma poderosa organização de místicos chamada de Os Sete (não confundir com o livro brasileiro homônimo). Após passarem anos estudando as artes místicas, mudaram-se para Nova York onde abriram uma agência de detetives com o intuito de resolver casos sobrenaturais.

Oculto foi aproveitado também por Neil

Gaiman
na série Livros da Magia (a história do VEDADEIRO Harry Potter), onde o personagem, junto com John Constantine e outros místicos (a “Brigada dos Encapotados”), ajudam Tim Hunter a adentrar no mundo da magia. Neil Gaiman também deu uma outra visão da relação Doutor Oculto/Rose Psychic, mostrando que, ao invés de irmãos ou parceiros, os dois eram na verdade as facetas feminina e masculina da mesma persona e essas facetas se alternavam dependendo da situação (Rose entrava em cena quando a situação exigia tato, delicadeza e comunicação, enquanto que Doutor Oculto aparecia quando a situação exigia força e conflito).

Atualmente, Doutor Oculto faz parte do grupo “Sentinelas da Magia” que antecedeu, por assim dizer, o Pacto das Sombras.

Curiosidades:

– More Fun Comics foi a primeira revista em quadrinhos publicada pela editora que mais tarde se tornaria a DC Comics;

– Doutor Oculto foi criado por Jerry Siegel e Joe Shuster, os mesmos criadores do Superman;

– Apesar de ter sua primeira aparição creditada em More Fun Comics, Doutor Oculto apareceu antes em outra revista, The Comics Magazine #1, da editora Centaur Publications. O curioso desta informação é que, além dele ter outro nome (Dr. Mystic), ele era mostrado como alguém que viajava por mundos místicos, sendo capaz de voar e usando uma roupa que era apenas uma sunga e uma capa. Ou seja, embora ele tenha sido reformulado logo depois, isso faz com que ele também seja o primeiro super-herói americano, antes mesmo de O Fantasma (1936) e do Superman (1939);

– Outros personagens que surgiram na revista More Fun Comics ao longo dos anos foram o Espectro, Senhor Destino, Arqueiro Verde, Aquaman e Superboy.

Na próxima Madrugada:

Mais uma vez Stephen King nos traz uma visão diferente e mais aterradora de uma situação – relativamente – comum. Na próxima semana, conheça o Kingdom Hospital.

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