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Bastardos Inglórios

DE FORA DA PANELA

“De fora da panela” no ar, graças a mais um leitor que viu, leu, ouviu, pensou, etc… alguma coisa legal por ai e mandou pra cá. Mande você também, caramba!! O tema é livre, envie para contato@uarevaa.com

Hoje o Jonathan Rodrigues, lá do Bloganimazonando, mostrou que, pra ele, promessa feita é promessa paga!! Outro dia ele prometeu nos Uarécados um review de Bastardos Inglórios, e olha o review ae!! Valeu, Jonathan.

Aldo Raine quer os escalpos

rindo do meu sotaque, engraçadinho?

Confesso que não sou nenhum fã do Tarantino e nem mesmo vi grande parte de seus filmes, mas vou falar particularmente de Kill Bill: eu acho legal mas um filme endeusado injustamente, não é a ultima gota de originalidade do mundo e nem é nenhuma obra-prima “do estilo” e muito menos um filme redondinho, do tipo que você não consegue tirar uma cena do lugar nem remover nada, é apenas um filme legal com idéias legais, mas que seu desenvolvimento, embora bom, não extrapolou “os limites do cinema cool” (se é que isso existe) em nada, além de suas doideras não soarem tão confortáveis e nisto engraçadas quanto deveriam.

Há quem diga que Kill Bill é o filme Tarantino “puro”, onde estão todos os elementos que fizeram a fama do diretor, e por isto eu tinha um bocado de birra com cara, Kill Bill é legal, mas tipo, legal de uma forma que um diretor qualquer com domínio de cinema e conhecimento dos generos cinematográficos que ele homenageia conseguiria fazer (por favor não me matem com uma adaga e entendam meu ponto de vista), não é um filme cinematograficamente profundo, não é tão diferente do que seria uma HQ contando a mesma história, Taranta não quebrou nenhuma barreira, não foi além, foi um bom realizador mas muito distante de “gênio” ou “autoral”.

Ignorem o fato de eu não ter assistido aos (anteriormente) 2 filmes apontados como os melhores do diretor (Pulp Fiction e Cães de Aluguel), mas estou falando pela minha pouca experiência com as obras dele e a sua ultimamente mais cultuada (Kill Bill no caso), mas aí que entra Bastardos Inglórios, foi aí que eu vi onde o Tarantino pode chegar, e foi aí que vi que sim, ele conseguiu ser genial e pôde fazer um filme que o faça poder receber este crédito.



Bastardos conta a história do grupo de soldados note-americanos e um alemão (isso mesmo) chamado “Os Bastardos” liderados pelo Tenente Aldo Raine que durante os primeiros anos da ocupação Alemã em território Françês na segunda guerra mundial ganha fama por cruelmente executar nazistas e os escalpelar (como diz Aldo, ele quer 100 ‘escalpos nazistas’ de cada um dos integrantes), paralelo a isto a judia Shoshanna Dreyfus busca vingança pelo extermínio de sua família pelo General Hans Landa, conhecido como “caçador de judeus”.

Bastardos Inglórios não é só descolado, engraçado, violento, tanto graficamente quanto psicologicamente, e etc. Ele eleva estes elementos, faz tudo parecer tão perfeito, tão bem encaixado, tão convicente que um público “totalmente conservador” (não tanto no sentido das imagens, mas na forma como o filme se comporta) pode assistir ao filme e não achar estranho em determinado momento num ‘filme histórico’ aparecer na tela um rabisco mostrando o nome do personagem e apontando sua posição, assim como ‘diálogos improváveis’ e outros “delírios tarantinescos”. Tarantino achou o tom certo e o filme ficou irretocável, não só para quem já conhece o que se pode esperar num filme dele, mas também para alguém que nunca ouviu falar “deste maluco”, ele mostrou não só aplicação de seu conhecimento enciclopédico sobre cinema, ele aplicou isto de sua forma, para o bem de sua obra e não a sobrepondo.. é algo como criar o Sonic por causa do Mario (o personagem Sonic foi criado pela SEGA em resposta ao mascote da Nintendo, desculpem, mas não achei exemplo melhor).

Explicando esta lambança aí: em Bastardos nós temos um filme único, que referencia outros filmes e gêneros, mas não se apoia totalmente nisto, ele funciona tanto para quem conhece os objetos de referência quanto para um “leigo” que está assistindo ao filme e nem percebe tais referências, pois o filme flui e funciona independente delas.


O filme também mostra uma desenvoltura narrativa impressionante, nós lhe damos com muitos personagens e mesmo assim o publico não fica confuso ou perdendo o foco dos acontecimentos, isto devido não só a forma como Tarantino apresenta os personagens, de forma forte e calma, em cenas como o capítulo 1 mas como também por esta mesma estrutura de capítulos ajudar o publico a captar a idéia de estar lidando com muitos “pedaços” e se ligar em ter atenção para construir o “quebra cabeças”.

Um ponto para se ressaltar é o humor do Tarantino ao criar a decupagem das cenas, repare nas cena onde temos Shoshanna à mesa com o diretor do filme O Orgulho da Nação e o ator principal e em determinado momento, depois de tomadas mostrando a tela passando pela mesa e pegando alguns personagens em primeiro plano, a cadela que se encontra sentada a ela (sim, isto mesmo) aparece da mesma forma que outros personagens.

Taranta brinca também com o que o publico espera dos clichês típicos de filmes, assim contruindo um clima ainda mais tenso nas cenas, como quando o Coronel Hans Lambda pede leite para Shoshanna ou mesmo na sua absurda risada na “cena do gesso”.

O elenco do filme é afiadíssimo, a muito tempo (muito MESMO) não vejo um filme com tanta atuação forte dividindo a tela ao mesmo tempo, e isto vai desde a melhor personificação do filme, Christoph Waltz como o Coronel Hans Landa até o coadjuvante que tem sua casa vasculhada no início, todos afiados e atuando tão bem que o filme nos puxa mais ainda devido a sinceridade e realismo de suas personificações, até o Eli Roth não atrapalha.

e falando de elenco: [comentário pessoal] Mélanie Laurent é uma gracinha. [/comentário pessoal]

Vale ressaltar também o trabalho de fotografia do filme feita por Robert Richardson, cara que venho acompanhando seus trabalhos desde quando vi O Aviador (filme pelo qual venceu o Oscar de melhor fotografia), o melhor trabalho de fotografia que já vi em um filme. Em Bastardos as tomadas são muito bem enquadradas e criativas, o trabalho da composição dos ângulos é uma das técnicas que mais admiro e nesse filme é um deleite mesmo neste aspecto. As músicas da trilha são muito bem empregadas, às vezes eu penso que tanto aqui quanto em Kill Bill o Taranta teve a idéia dos filmes, ou pelo menos a principal fonte de inspiração para o desenvolvimento deles escutando as músicas do Ennio Morricone tamanha a forma como eles são bem utilizadas.


O fim do filme é muito interessante e meio que prova onde Tarantino pode chegar em relação ao desprendimento do convencional e ao seu nível de visão narrativa, ele dá pano pra manga para discussões sobre liberdade criativa, ironia e as teorias de que Tarantino faz “universos maiores do que seus filmes”, mas não posso falar mais por causa dos spoilers.

Este é o exemplo de filme onde por mais que se fale (e se perca tentando) você muito pouco chegará a mostrar o porque de sua grandiosidade, é cinema denso, criativo, e “puro”. Bastardos é muito mais do que o ‘filme do Tarantino’ hiperviolento de caras arrebentando a fuça de nazistas e cortando os seus escalpos, é muito mais do que isto, e o mais importante, cinematograficamente (em toda a densidade que este termo poderia sugerir) muito mais do que isto.

Bastardos ao fim da sessão me fez sentir como nunca antes numa sala de cinema, senti que estava presenciando o surgimento de um genuíno classico, e a internet ‘só’ vai imortalizar minha afirmação que com o tempo provavelmente se tornará verdadeira.

Nota: 10,0

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