“Na Bruxaria, cada um de nós deve relevar sua própria verdade”
The Spiral Dance: a Rebirth of the Ancient Religion of the Great Goddess
Muito já foi falado no Madrugada Macabra sobre os mistérios da natureza e da realidade, além da crença no sobrenatural, na existência de criaturas míticas e na influência de fatores paranormais nas vidas humanas. Falamos sobre criaturas com poderes paranormais, sobre homens brincando de deus, sobre maldições milenares. Ignorando, é claro, a discussão sobre a veracidade ou não destas e para efeitos de argumentação admitindo que tais forças sobre/supranaturais de fato existam em algum nível, seria possível para o ser humano adquirir a capacidade de manipular estas forças ao seu favor? Controlar a natureza, ser senhor da vida e da morte? É exatamente disso que se trata um dos temas mais antigos da humanidade (relacionado ao sobrenatural), a Bruxaria.
As origens dos conceitos relacionados ao que hoje chamamos de Bruxaria remontam à pré-história. Embora seja difícil precisar qualquer época, é seguro afirmar que tudo começou ainda quando o homem estava nas cavernas, e atribuía a seres invisíveis (geralmente mulheres – me desculpem os que gostam de ver deus como um ser masculino, mas as primeiras deusas eram provavelmente mulheres) a responsabilidade pelas forças da natureza (sol, vento, noite, tempestades, etc). Estas crenças se repetiram em diversas outras culturas, tornando-se mais complexas em lugares como a Grécia e o Egito Antigo, mas mantendo as mesmas características: seres humanóides aos quais eram atribuídos os inexplicáveis mistérios da natureza, bons ou ruins, muitos deles possuidores de dons mágicos. A noção de que a própria natureza seria uma entidade por si só (a “mãe natureza”) também é um conceito bastante antigo (tanto é que a palavra “natureza” vem do latim “natura”, e significa “nascimento”). Aliás, a comunhão, respeito e adoração à natureza era a base da bruxaria original (e embora alguns discordem desta afirmação, a bruxaria é provavelmente a “religião original”).
Não há como se precisar com certeza onde as alegações de que era possível manipular as forças da natureza passou dos deuses para os mortais, mas os relatos de bruxas estão espalhados por virtualmente todas as culturas antigas do mundo, embora diferindo levemente em alguns aspectos. Na Ásia, a Babilônia é um notório local onde a bruxaria era algo comum (sendo visto inclusive em relatos bíblicos, onde estas práticas eram consideradas exclusivamente malignas e condenadas pelo cristianismo); no folclore japonês, há duas categorias específicas de bruxos(as): os que possuem cobras como seus representantes, e os que possuem raposas; em lugares como o Haiti, o mito dos Zumbis está intimamente ligado à bruxaria; o Egito Antigo também possui um histórico abrangente de práticas de bruxaria.
Mas as noções de bruxaria que conhecemos hoje estão ligadas especialmente às crenças que surgiram e cresceram na Europa durante a Idade Média, e cuja repercussão histórica é notável, principalmente devido ao escopo que tais crenças abrangeram. Embora histerias a respeito de criaturas sobrenaturais não tenham sido incomuns no passado, com abertura de tumbas de supostos vampiros e caça aos lobisomens, foi a Bruxaria que levou o homem moderno mais longe em termos de barbárie provocada por medo e superstição.
Originalmente a Europa não associava a bruxaria a práticas demoníacas, relacionando-as com Diana (Deusa romana da caça e dos bosques). A caça as bruxas começou de forma mais intensa no Sudeste da França e na Suíça, se desenvolveu entre os séculos 14 e 15 e atingiu seu ápice no sudoeste da Alemanha entre 1561 a 1670, não por acaso em uma época onde a influência da Igreja (tanto popular quanto política) era grande o bastante para convencer as pessoas que as Bruxas (que em sua grande maioria eram mulheres) eram amantes do demônio e, portanto, malignas por natureza. Isso levou a uma perseguição insana por quaisquer mulheres que fugissem dos padrões considerados corretos pela sociedade da época. Além disso, foi a desculpa necessária para uma série de condenações que tinham na verdade outros propósitos (era comum o marido traído acusar a mulher de bruxaria, bem como mulheres com quem padres tiveram casos secretos e acabaram engravidando, às vezes como forma de vingança ou até para se apropriar de bens alheios, apenas para citar algumas situações). Os “métodos” utilizados para confirmar que a mulher era bruxa não eram nem de longe justos e muitas vezes (para não dizer a maioria delas) utilizava-se de tortura, que nunca serviu de fato para confirmar se a mulher era bruxa, e sim fazê-la confessar de qualquer maneira. Fazendo um paralelo com a época da perseguição comunista nos anos 50/60, você tinha que fazer de tudo para não ser acusada de bruxaria pois, se fosse, tarde demais. Você já era bruxa e não voltaria a ver a luz do dia.
Foi este período de caça às bruxas que trouxe para os tempos modernos (embora isso tenha mudado nas últimas décadas) o conceito de que toda a bruxaria é inerentemente ruim e toda a bruxa é um ser maligno, não raro associada à práticas satânicas. No entanto antes disso a bruxaria por si só não era considerada uma coisa maligna; era uma capacidade que o seres humanos (principalmente mulheres) eram capazes de adquirir, e poderiam usar tanto para o bem quanto para o mal. As bruxas estavam, no passado remoto, mais ligadas ao xamanismo do que ao demonismo, sendo, assim como os xamãs, figuras sociais que auxiliavam em aspectos como saúde, e comunicação com os mortos e/ou com os deuses.
Curiosidades:
– A Igreja Católica não foi a primeira instituição a condenar a bruxaria, e nem a idade média o único período; através da história e através das culturas, foi comum líderes condenarem estas práticas com medo dos poderes que as bruxas possuíam;
– Aliás, falando em idade média, novos registros históricos mostram que, ao contrário do que se pensa, a caça às bruxas começou no fim da idade média e se estendeu por boa parte da idade moderna, sendo este período o mais marcante da perseguição às bruxas;
– Estima-se que cerca de 50 mil pessoas tenham sido vítimas da caça às bruxas, sendo destas apenas 25% homens;
– Curiosamente, a grande maioria das vítimas era cristã;
– Muitas pessoas acusadas de bruxaria por “estarem possuídas pelo demônio” podem ter sofrido os sintomas de um fungo comum no centeio e outros cereais que ataca o sistema nervoso central. Quem comesse pão infectado com aquele fungo sofreria seus sintomas. Isso também foi uma das explicações para a praga da dança de 1518;
– Witch (o termo em inglês para bruxa) deriva do inglês antigo, mais especificamente das palavras wicca e wicce, respectivamente o masculino e feminino de “Feiticeiro(a), mago”;
– Antigamente, Bruxaria e feitiçaria se diferenciavam pelo fato de, na bruxaria, não ser necessário ferramentas físicas específicas nem ações coreografadas para lançar um feitiço.
Na próxima Madrugada:
As bruxas continuam amaldiçoando os posts do Madrugada Macabra, agora em Bruxaria – Na Ficção.