Quadrinho?

Olá pessoas, hoje já entrando no modo fim de semana, aquela preguiça e malemolência típica, trago para vocês uma compilação de perguntas e respostas sobre quadrinhos feitas no formspring.me para o nosso colega de Uarévaa e escritor Rafael Rodrigues (até o nome é de alterego de super-herói não é?). Ele discorre sobre algumas opiniões relativas à nona arte, seu momento atual e o mundo brazuca de hq´s. Vamos ver então!
PS: Sim, fui safado nessa agora, mas… uarevaa né!

Quadrinhos é para nerd, Grant Morrison é para redator, escritor, blogger, alguém que gosta de coisas simples, como ciência, comics, UFOS e terror. Sabe, coisas normais?
Rafael: Quadrinhos é pra todo mundo. Dizer que uma coisa é de nerd, ou de patricinha, ou de burro ou de inteligente não deixa de ser uma forma de preconceito e de segmentar as pessoas. Quadrinhos é pra qualquer um que se dispor a ler. Grant Morrison também é pra qualquer um que se dispuser a ler, só com um pouco mais de atenção…
Qual sua opinião sobre HQ´s no Iphone?
Rafael: Bom não tive ainda oportunidade de ler uma hq via Iphone, mas acho um meio um pouco limitado. Acho difícil encontrar pessoas dispostas a explorar as possibilidades desse meio, pelo menos por enquanto. Acho uma boa forma de continuar difundindo os quadrinhos, mas não vejo por enquanto como explorar histórias além do impacto visual.
Mas, é o futuro, vamos ter que esperar pra ver o que dá. Talvez desenvolvendo hqs mais multimídia, com ajudar de efeitos de transição, áudio, entre outras coisas, talvez possamos ver idéias interessantes brotando daí…
Qual sua opinião sobre as leis de incentivo governamentais, no que tange aos quadrinhos?
Rafael: Acho que pode ser bom ou ruim, dependendo do que o artista pretende. Particularmente, acho que incentivos governamentais ajudam a obra a ser publicada, o que é ótimo. Se o quadrinista tem a visão simplista de que apenas publicar sua hq já é mais do que ele pode esperar, então acho que esse é o caminho. Mas se o cara pretende viver disso, acho que é insuficiente. Mas aí entraria numa questão de um “mercado” de quadrinhos nacionais que, hoje em dia, é inexistente. Então, acho que por enquanto é o que temos, mas não acho que os quadrinistas deveriam se apoiar só nisso. Acho que eles deveriam tentar andar com as próprias pernas. Alguns autores já estão fazendo isso e estão se dando muito bem, não necessariamente vivendo de quadrinhos, mas conseguindo publicar suas obras e aos poucos tendo certo respaldo no segmento, o que já é um começo…
O que você acha dos quadrinhos nacionais?
Rafael: Bom, primeiro, acho que é bom evidenciar a diferença entre quadrinhos feitos no Brasil e quadrinhos nacionais. Dizer que uma hq é “nacional”, implicaria uma série de fatores ligados à essência, por assim dizer, do próprio país. No caso dos quadrinhos feitos no Brasil, tudo e influenciado diretamente pelo que fazem os estrangeiros, com pouca ou nenhuma raiz nacional. Então, neste caso, acho injusto chamar estes quadrinhos de “nacionais”. São quadrinhos brasileiros, sem dúvida, mas estão longe de ser nacionais.
Se a gente analisar a produção de quadrinhos americana, européia e japonesa, só pra citar os mais evidentes, vamos notar que as diferenças vão muito além do estilo da história, do gênero ou do estilo de desenho. Essas hq’s são desenvolvidas dentro de regras narrativas e métodos específicos vinculados diretamente à cultura e os costumes do país de quem está escrevendo.
Seguindo este raciocínio, para que uma hq brasileira pudesse ser considerada “nacional”, ou seja, própria do nosso país, ela deve se diferenciar das outras produções, encontrando suas próprias regras narrativas, seus próprios métodos e seus próprios meios dentro da arte seqüencial. Isso é o que podemos chamar de “identidade”. Sem identidade própria, uma hq feita no Brasil é apenas uma hq feita no Brasil, nada mais.
Dentro das revistas em quadrinhos, existem pouquíssimos exemplos de quadrinhos nacionais, dos quais destaco a Turma da Mônica (a original, não a jovem, esta sofre dos mesmos problemas que citei antes e que, acredito, diminuem a hq como expressão artística), mas a identidade nacional dos quadrinhos sempre ficou relegada em sua quase totalidade às tiras de jornal.
Acho que os quadrinistas ainda precisam percorrer um caminho muito longo para transformarem uma hq brasileira em uma hq nacional com identidade própria. e só quando isso acontecer é que poderemos pensar em falar sobre quadrinhos nacionais com mais exemplos e menos especulação.
Qual é o caminho para termos “quadrinhos nacionais”, então?
Rafael: Bom, acho que encontrar seu próprio caminho é um começo. Não existe uma resposta certa para esse tipo de coisa. Os quadrinhos americanos não surgiram e evoluíram porque um grupo se reuniu e decidiu como seriam as coisas, elas simplesmente foram acontecendo. Uma criação aqui, outra ali, uma tentativa de experimentalismo aqui outro ali. Por fazerem parte do mesmo país, e da mesma cultura, similaridades foram encontradas no trabalho, que se tornou uma espécie de “padrão”.
Acho que o problema é que os quadrinistas brasileiros tem medo de arriscar. Sei que é estranho dizer isso de artistas que estão sempre colocando a cara pra bater num mercado virtualmente inexistente, mas é o que eu vejo. Eu vejo muita vontade de colocar seu trabalho na rua, mas muito amadorismo e medo de ousar. Os amadores querem apenas copiar o que já foi feito (principalmente em outros países) e os profissionais tem medo de ousar na forma e conteúdo das hqs, preferindo se ater ao básico.
Isso é o que, particularmente, acho estranho, porque quadrinhos aqui no Brasil, por enquanto, está sempre no campo do experimentalismo, não existe uma “indústria”, ou um mercado que o valha. Se formos parar para analisar, quadrinhos (quando não considerado coisa de criança, o que é a maioria dos casos) é mais considerado arte do que entretenimento. Então, porque não aproveitar isso e subverter as coisas? Acho que este pode ser um caminho.
Acho que o Brasil é um país que pode ter lugar para todo o tipo de conteúdo em quadrinhos, desde que bem feito. Mas, sinceramente, acredito que tem elementos com os quais os brasileiros não se identificam. Os super-heróis (no modelo americano) são um exemplo.
Acho também que existe uma variedade cultural imensa no país que não é explorado; cada estado, em termos culturais, parecem um país diferente, cada qual com suas referências e tradições. Acredito que, ao invés de se ater apenas a histórias autobiográficas ou que retratam a chamada “realidade brasileira” (ou do sertão), os quadrinhos nacionais se beneficiariam muito se fossem influenciados pelos diversos aspectos da cultura nacional.
Desses, é interessante falar do filme Besouro, que apesar de não ser HQ, tentou utilizar esses elementos. Talvez os quadrinhos se beneficiassem com propostas semelhantes. Mas essas são só idéias, e aposto que quem trabalha com quadrinhos no país têm muitas outras. A questão é quando elas começarão a ser colocadas em prática…
Quais projetos de quadrinhos nacionais que você acha que deram certo ou sejam bons modelos para se seguir?
Rafael: Olha, excluindo as tiras (que encontram uma penetração muito maior), no caso as revistas em quadrinhos, um dos “modelos” que deram muito certo, e por muito tempo, foram os quadrinhos de terror produzidos na época em que as histórias da EC Comics eram publicadas aqui. Além dessas histórias americanas, as revistas tinham muitas coisas produzidas inteiramente por brasileiros, e com histórias tipicamente brasileiras (utilizando temas como macumba, por exemplo, só pra citar um). Ainda acho que o Brasil tem um ótimo público para os quadrinhos de terror, e seria um ótimo nicho a ser explorado. Outro exemplo era a revista dos Trapalhões (sim, acredite!), publicada lá pelos anos 70. Esse era um bom exemplo de quadrinhos como “forma” bem nacional, até os traços dos desenhistas, embora diferentes, tinham características que os diferenciavam totalmente de artistas internacionais, e ainda tinham alguma coisa em comum, o que quase constituía um “modelo” de arte nacional.
Acho que não tem como não citar a Turma da Mônica, também, apesar de que acho que não pode ser considerado um “modelo”, pois ele é tão característico que só funciona com a turma mesmo.
Em anos mais recentes eu li muito pouca coisa de quadrinhos brasileiros, mas eu gosto muito do que tem sido feito com Necronauta (que tem uma narrativa gráfica quase expressionista) e com a revista Ato 5, mas ainda acho que em termos de “forma”, não conseguiria citar um exemplo de modelo para se seguir. Em termos de criatividade e conteúdo, no entanto, os artistas brasileiros estão se puxando bastante ultimamente…
Mas acho que se seguissem esses dois aí (Necronauta e os quadrinhos do André Diniz), já seria uma boa maneira de começar…

Marcelo Soares é jornalista, desafiador do impossível, editor flash e quase sempre um grande preguiçoso!

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