Lost: Um salto de Fé
Por Marcelo Soares
Foram seis anos, seis belos anos de suspense, emoção, dúvidas e mistérios, seis anos em que como um amigo próximo nos preocupamos, reclamamos, relacionamos com a vida de pessoas desconhecidas, que nem de fato existiam só em nossas imaginações, mas que já eram parte de nossa família. Seguimos sua jornada desde uma queda de um avião, um avião que levava pessoas sem rumo na vida, perdidas em seus problemas e em busca de uma esperança, um futuro, um propósito.
Aviso: Contém Spoilers
E não somos todos assim, não estamos sempre em nossa ilha particular procurando superar o mais novo obstáculo, aquela fumaça negra que nos derruba e tenta nos destruir de episódios em episódios de nossa vida, responder perguntas que a cada minuto surgem e a cada resposta novas e mais novas perguntas surgem, em um ciclo eterno que demora a terminar, mas termina só uma vez.
Lost não foi só uma série como tantas onde depois de um episódio comentamos algo, mas não fica ecoando em nossa mente. A série nos fez pensar sobre valores que hoje em dia são tão esquecidos. Nos fez fazermos perguntas fortes, como até onde iríamos para proteger nossos amigos, quanto vale um amor verdadeiro, até onde ser cético completamente pode nos prejudicar.
John Locke logo no primeiro episódio diz que viu o centro da Ilha e ele era lindo. Hoje, sabemos que o centro da ilha não era só um lugar com uma luz brilhante, era o local de redenção, de salvação para vidas deslocadas. Durante seis anos vimos aqueles personagens crescerem, mudarem, se redimirem de seus erros e nós também, mesmo que um pouco só, mudamos com eles. Uns morreram para salvar a todos, outros se tornaram pais e mães, alguns deixaram de lado suas próprias convicções e ideologias por um bem maior, passaram a simplesmente acreditar, aceitar que nem tudo pode ser explicado e algumas coisas na vida são feitas em um puro salto de fé.
Locke era o homem de fé, aquele que rapidamente percebeu isso, mas era um homem só de fé, acreditava completamente. E já dizem os filósofos que é preciso fé cega e pé atrás. A fé completa pode nos cegar e fazer com que não enxerguemos as nuances que existem. Jack Shepard era um homem da ciência, um cético, alguém que sempre tinha dúvidas, mas que na Ilha buscava descobrir um propósito para sua vida, propósito esse que só surgiu quando ele passou a ter fé, a aceitar o desconhecido e esperar estar tomando a decisão certa e não ter certeza que está tomando.
Fé e dúvida, dois pontos inicialmente contraditórios, mas que se unem para guiar uma vida. E assim também foi com os fãs da série, que mesmo com dúvidas e medos tinham fé em Lost, acreditavam que no fim tudo se encaixaria. Claro que todos gostariam de saber mais sobre o conceito de uma fumaça ou sobre arquitetos de estátuas, caixas que caem do céu, regras mágicas, mas ao fim de tudo, percebemos que nunca foi sobre isso que a série falava. Na verdade, sempre soubemos, mas a curiosidade humana nublou em certos momentos nossos olhos.
Lost sempre foi uma série sobre pessoas, especificamente sobre algumas pessoas que caíram de um avião e assim como a vida nos trouxe milhões de perguntas que nunca serão respondidas. Afinal, qual o prazer de se saber tudo, até mesmo John Locke que achava saber tudo se perdeu por conta dessa certeza. Foram emocionantes esses seis anos, tempo que pela primeira vez em minha vida discuti ardorosamente uma série. Esse também é um grande mérito de Lost, fazer com que o telespectador não seja mais tão passivo. Ele debateu em fóruns, participou de jogos de realidade virtual, criou teorias, enfim, não foi uma série qualquer
.
E agora ela terminou, mas não se acaba no fim, nós seguimos adiante para descobrir o que vem na próxima porta. Lost chegou ao seu desfecho junto com seus fãs e de uma forma fantástica, uma forma que valorizou seus personagens, respeitou aqueles que se apegaram antes de tudo aos sobreviventes do Vôo 815 da Oceanic Airlines. A ilha terminou com eles e nós também, quem sabe não os vemos em outra vida ainda, todos juntos e felizes. Pois, nunca saberemos o que o futuro nos reserva, e o fim sempre é um novo começo.