O maior representante da América teve seus altos e baixos nas últimas eras, indo de aventuras lamentáveis a transformações radicais mais recentes. Atualmente, Steve Rogers é apenas Steve Rogers. O papel de capitão América está com seu antigo parceiro, Bucky Barnes.
“Enquanto isso, na banda desenhada…” é uma seção que traça um paralelo entre o universo real e o mundo dos quadrinhos, analisando como as duas realidades afetam uma à outra, trazendo informação e estimulando a reflexão acerca dessa 8ª arte.
Histórias em quadrinhos são um meio complicado, em todos os sentidos. Complicado para os leitores, pois os quadrinhos trazem linhas cronológicas em certos personagens que chega perto de um século e muitas vezes para se entender uma história é necessário conhecer muito dessa cronologia; para o mercado, pois os quadrinhos, apesar de populares dentro de seus próprio nicho, ainda não são “grandes” o suficiente para competir com outros mercados como o cinema e a literatura (embora o quadro, pelo menos nos EUA, pareça estar gradualmente mudando); e é principalmente complicado para os autores, que precisam pagar suas contas com histórias fáceis e acessíveis, mas que muitas vezes gostariam de ousar mais e se vêem limitados pelo mercado que tanto adoram.
Seja qual for o lado, o fato é que os quadrinhos lutam para serem levados a sério. Afinal, por muito tempo os comics foram marginalizados, relegados a condição de entretenimento barato e infantil. E por um tempo foram isso mesmo. Claro que muitas coisas mudaram com as décadas, e hoje, podemos dizer – como diria Sidney Gusman, do Universo Hq – que quadrinhos é também para criança. Mas também é para o adulto, para mulher, para o homem, para o idoso, para o homossexual, para o judeu, para o evangélico, para duendes amarelos… Em outras palavras, quadrinhos são para todos.
É triste, no entanto, perceber que, na ânsia e porque não dizer, no desespero de tentar validar os quadrinhos como expressão artística relevante, as pessoas se esquecem que nem sempre os quadrinhos precisam se levar a sério. Os anos 90 representou um período em que os comics americanos tentavam se levar tanto a sério que se tornaram caricatos. Homens com trabucos, mulheres gostosas de pouca roupa e coluna torta, dentes serrados e personagens perturbados era o máximo que os limitados autores e editores da época conseguiam pensar quando imaginavam algo mais maduro e extremo. Esses e outros “movimentos” – pois creio que é possível caracterizar o chamado “grim ‘n gritty” como tal – tentaram se levar a sério demais e acabaram ficando ridículos. E isso acabou nos lembrando que, no fim das contas, histórias em quadrinhos são apenas isso: histórias em quadrinhos. E às vezes nós também queremos rir com histórias em quadrinhos. Às vezes é bom que os quadrinhos não se levem à sério. E o personagem que irei apresentar é uma prova disso.
Em agosto de 1941, uma revista chamada Police Comics trouxe diversos super-heróis (Como O Bomba Humana e Lady Fantasma) e, entre eles, um estranho personagem chamado de Plastic Man. Conhecido aqui no Brasil como Homem Borracha, o personagem era originalmente Patrick “Eel” O’Brian, que ficou órfão aos 10 anos e passou a viver nas ruas, o que acabou o levando ao crime. Mais tarde, durante uma tentativa de invadir uma indústria de químicos, ele e seus comparsas foram surpreendidos por um vigia, que conseguiu atirar em O’Brian, que por sua vez recebeu uma quantidade de um estranho ácido. Seus comparsas o deixaram para trás, confuso e eventualmente inconsciente.
O’Brian acordou em um monastério (!), onde descobriu que havia sido encontrado por um monge, que viu nele uma grande capacidade para o bem e resolveu ajudá-lo. O’Brian, tocado pela bondade do Monge (que despistou a polícia e tudo), aliado à frustração de ter percebido como seus comparsas deixaram ele para trás sem o menor remorso, decidiu então mudar de vida.
Durante seu período de recuperação no monastério, descobriu que possuía a capacidade de moldar seu corpo da forma que quisesse, e decidiu usar isso para combater o crime do qual um dia ele havia feito parte. Decidiu usar um uniforme maleável de borracha e se tornou o Homem Borracha. Sua identidade de Eel O’Brian foi mantida, pois assim ele podia usar suas conexões com o submundo para combater o crime mais facilmente.
Apesar da história com tons sérios – e totalmente bizarra, até para a época – as histórias do Homem Borracha sempre tiveram a tendência para a comédia. Não demorou muito para ele conseguir um hilário sidekick, Woozy Winks, que não usava uniforme nem nada, era apenas um cara comum… Que tinha sido magicamente abençoado com uma sorte do caramba, onde não podia ser ferido. Em termos de cronologia, ainda na Era de Ouro, o personagem passou a fazer parte da polícia de sua cidade, e terminou sua carreira como agente do FBI, abandonando a identidade secreta.
Na Era de Prata, assim como a grande maioria dos personagens da Era de Ouro, Homem Borracha foi reformulado. Mas agora quem assumia o manto era Arnold Drake, seu filho, que quando criança tomou uma pequena dose do mesmo composto que dera poderes ao seu pai. Mas durante a bagunça que foi a descoberta do multiverso DC, diversas versões do original da Era de Ouro também foram apresentadas durante esse período.
Depois da Crise Nas Infinitas Terras, que reformulou todo o universo DC, a origem do Homem Borracha mudou, em alguns aspectos drasticamente. Deixado para trás por seus comparsas criminosos após ter sido atingido por uma substância desconhecida, O’Brain vaga as ruas assustando as pessoas com sua nova condição, e percebendo que havia se tornado um monstro, decide se matar. Ele é impedido por Woozy Winks, um paciente de um hospício que foi chutado de lá porque a instituição estava indo à Falência. Woozy convence O’Brian a desistir da idéia de se matar, então os dois ficam juntos por um tempo, cada um com um objetivo diferente: Homem Borracha quer ganhar dinheiro, mas fica na dúvida se ganha mais dinheiro combatendo o crime ou sendo criminoso, e Woozy quer apenas seu quarto (do hospício) de volta.
Recentemente, descobrimos que O’Brian teve um filho, que se tornou um herói chamado Offspring (e que por um tempo atuou com os Titãs). Pouco antes dessa época, Homem Borracha teve uma nova revista, onde foi reinterpretado pelo gênio underground Kyle Baker. Baker retomou muitos conceitos da Era de Ouro e que estavam lentamente sendo reincorporados ao personagem, como o fato dele ser agente do FBI e com histórias cômicas e altamente surreais construiu uma das melhores e mais malucas histórias de super-herói de todos os tempos. A revista durou 20 números, mas infelizmente as histórias não chegaram a serem publicadas por aqui (pelo menos não até onde eu saiba).
Atualmente, Homem Borracha continua fazendo parte do Universo DC, sendo sempre o “humorista” de qualquer grupo heroico, geralmente a Liga da Justiça.
Epílogo: Curiosidades
– Originalmente Homem Borracha foi publicado pela Quality Comics, casa de personagens como Boneco, Lady Fantasma, Bomba Humana, Combatentes da Liberdade, entre outros, e que posteriormente foi adquirida pela DC;
– O nome do personagem (Plastic Man, Homem de Plástico) era pra ser realmente “India Rubber Man” (Algo como O homem borracha da índia), mas o editor preferiu colocar “Plastic”, pois plástico era o produto “inovador e moderno” da época;
– Homem Borracha teve uma série de desenhos animados em 1979:– Mais recentemente, foi produzido um piloto de uma nova série animada do personagem, que não foi aprovada e nunca chegou ir ao ar. Mas graças à internet, podemos ver o episódio na íntegra:
A seguir: ?