Distrito 9

DE FORA DA PANELA

Novidade aqui no Uarévaa!! Inééééédito, inédito, inédito… Um fabuloso review de… Sim… Distrito 9… De novo….. Eu sei… O Diogo já falou muito bem desse filme, a Pin já encheu a bola dele tambem.. Mas o Inferno já cansou de mandar esse review pro MDM e ficar na pista e agora resolveu pedir penico aqui, bwahahaha

Então, se voce é preguicoso igual a mim (Freud falando) e não foi no cinema ainda, tai mais um bom motivo. Lê ai!!


O que vocês esperam ver quando assistem a um filme de ficção científica? Lasers? Naves cruzando o espaço como quem atravessa a rua? Aliens exóticos maravilhados com a tecnologia humanóide? Seres humanos evoluídos e avançados tecnologicamente liderando uma federação de planetas e levando a ‘mensagem’ humana aos confins do universo? Ou humanóides com espadas feitas de luz liderando outras raças na eterna luta entre o bem e o mal?

Se é isso que você espera de um filme de ficção científica você vai se surpreender (para o bem ou para o mal) com Distrito 9.

Sob as bênçãos do venerado Peter Jackson (Senhor dos Anéis (porque King Kong foi um lapso)) e dirigido pelo novato sul africano Neil Blomkamp, o filme começa a se diferenciar do normal do gênero sci fi a começar pela narrativa, que usa e abusa (as vezes abusa demais) da câmera em primeira pessoa, recurso inovador em “A Bruxa de Blair” e bem usado também em “Cloverfield” e “Rec” mas que justamente por ter sido usado várias vezes no cinema dá aquela sensação de ‘po, lá vem o estilo de documentário de novo’, o que, se não compromete a qualidade do filme, torna-o meio didático demais, mas é até compreensível se considerarmos que se trata de um diretor iniciante e ávido por passar a sua mensagem.

Porém o grande diferencial do filme não é a sua estrutura narrativa (ainda bem!). A grande sacada de Distrito 9 é que ele mostra seres humanos do jeito que seres humanos são: mesquinhos, violentos, preconceituosos e hipócritas. Essas facetas não muito elogiáveis de nós em filmes de sci fi são coisa rara, eu pelo menos não me lembro de nenhum do gênero que nos colocasse ‘nos nossos devidos lugares’.

O filme começa mostrando o pequenino e irrelevante burocrata Wikus Van de Merwe, excitadíssimo por estar sendo filmado por uma equipe de reportagem e por ter sido promovido dentro da estrutura da MNU, o Departamento de Bem Estar de Aliens, agência criada para vigiar/conter a população de alienígenas que pediu auxílio em nosso planeta porque a nave deles deu um defeito e ficou estacionada sobre a cidade de Johannesburgo, na África do Sul. Tendo recebido abrigo em solo sul africano, os alienígenas foram postos em uma área cercada conhecida como Distrito 9, não por acaso bem semelhante a outros guetos que viraram verdadeiras nações dentro da África do Sul, como o Soweto e a Swazilândia. Com o tempo o espanto e o encantamento dos humanos frente a visita extra terrena cede lugar aos humanos desejos de se apoderar da tecnologia deles e o repúdio à figura bizarra de criaturas que parecem camarões gigantes, mas a cobiça sobre as armas alienígenas esbarra no empecilho delas serem geneticamente desenvolvidas, ou seja, só funcionam com o DNA dos aliens, são inúteis para humanos. Uma vez que não podemos nos fartar com as poderosas armas deles só nos resta o repúdio, e nisso nós temos bastante experiência: passamos a tratar os aliens como ‘os camarões’, os segregamos em um gueto, impedimos a entrada deles em ambientes exclusivos para humanos, e logo o gueto vira o paraíso de traficantes de ração de gato (é, eles são fissurados em ração de gato) e prostitutas humanas que prestam seus serviços a aliens taradões . Uma vez que a população alienígena estava crescendo e o gueto se tornando um problema para a cidade, a MNU tem a brilhante idéia de deslocar todos os camarões para outro gueto bem distante do centro urbano e encarrega para isso o nosso pequeno burocrata Wikus Van de Merwe (coincidentemente genro do chefe da MNU), com a missão de remover os alienígenas por bem ou por mal. Para isso ele conta com uma armada-até-os-dentes força policial disposta a se livrar do incômodo que perturba a vida dos pacatos e brancos cidadãos Johannesburguenses.


Vistos como um enorme problema sem solução mas que pode ter remoção, os aliens não gostam nada da idéia de serem tirados de perto da sua nave mãe, sabem que os humanos os odeiam e os desprezam, não fazem a menor questão de se integrar a quem passa mal só de olhar para eles e daí surge o conflito inevitável com a força policial e truculenta da MNU, e no meio da iminência de uma guerra civil dentro do gueto o pequeno Wikus sofre um acidente que o fará aos poucos perceber que seres humanos têm uma enorme incapacidade de olhar o sofrimento alheio, exceto quando sentem na carne esse sofrimento, e esse passa a ser o grande mote da história: aos poucos o pequeno Wikus vai percebendo como a nossa mesquinhez e preconceitos trazem sofrimento aos alienígenas, que em sua maioria com o tempo se conformaram em ser tratados como ‘coisa menor’ e sucumbiram ao álcool, ao crime e a uma vida miserável, o que só reforça a visão estereotipada de que eles são sim uma ‘coisa menor’. É amiguinhos, as senzalas e guetos foram/são experiências muito bem sucedidas em mostrar como acabar com a dignidade de um povo inteiro. Somos bons nisso.

No meio desse manifesto político/social que é o filme, a esperança dos aliens é o retorno para casa, esperança nutrida por um deles, determinado em consertar a nave e retornar com seu filhote para o lar. Aliando-se ao perturbado Wikus em pleno processo Kafkiano (não vou falar mais do que isso para não ser muito spoilerento) os dois unem forças para poderem sair do gueto, tanto no campo físico quanto da opressão sofrida.Não pensem que se trata de um tratado sociológico de um almofadinha de esquerda recém saído da faculdade. O filme possui cenas de ação com tiroteio, um vilão careca que dá vontade de matar com requintes de crueldade, bastante violência e até humor (pra quem gosta de humor bizarro como eu). Apesar da pouca experiência do diretor ele conseguiu imprimir uma forte mensagem social em um filme de ficção científica, conseguiu fazer uma interessante metáfora de uma sociedade marcada pelo ódio racial e mais ainda, passou para nós o necessário recado de que não há muita coisa em nós para nos orgulharmos quando o assunto é lidar com o próximo.

Humanos fedem.

Inferno é humano, mas queria ser uma víbora.

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