“De fora da panela” no ar, graças a mais um leitor que viu, leu, ouviu, pensou, etc… alguma coisa legal por ai e resolveu dividir com a gente. E voce, hein? Vambora galera!! Mande o seu texto para contato@uarevaa.com
Hoje temos um estreante no “De fora..”, o Jonathan Rodrigues, lá do Bloganimazonando. Voces já viram o filme Up? A Pin já deu a dica aqui e o Jonathan vem pra reforçar que é realmente imperdível. Confere ai!!
e a Pixar pela primeira vez faz seu filme VISIVELMENTE dedicado ao público adulto
Vou começar já deixando claro minha opnião em poucas palavras: UP é um filme excelente, maduro, sincero, e, porque não, forte, que vai ficar em sua lembrança por muito tempo, além de uma obra única sobre o assunto que resolveu abordar.
UP conta a história de Carl Friedereksen, e sua trajetória de vida, desde a infância onde era fã de histórias de aventura a quando se casou com sua amada Ellie com quem dividia seus sonhos e ideiais, com a morte de sua esposa Carl passa a repensar sua vida e decide amarrar sua casa a balões e sair voando em direção às paisagens selvagens da américa do sul (uma promessa que fez à Ellie, de levá-la até aquele lugar, e não foi capaz de cumprir), sem saber que um balofo menino escoteiro chamado Russel também estava ‘à bordo’.
O filme inicia-se de forma belíssima, original e extremamente corajosa (se voce considerar o fato de que está vendo um filme vendido como infantil), e nisso nos colocamos na situação de seu brilhante protagonista e em sua riqueza emocional como personagem, sendo assim caminhamos com Carl em sua aventura ao mesmo tempo que vamos nos identificando mais com o porque de sua jornada e torçendo por ele. Mas este argumento não deixa UP apenas como um “filme extremamente dramático” (meu conceito de dramático é bem diferente do consenso já que acho que é o drama em si que move qualquer tipo de história no cinema, mas isto é conteúdo para outro post e por isto as aspas) já que na tela ganha espaço varias de outras facetas da história, UP não deixa de ser um filme de tom aventuresco (que é muito necessário), bem humorado e com muita ação, mas o coração dele e o que o move não deixa de estar em seu protagonista e nos seus sentimentos.
Justamente esta variedade de estilos talvez tenha causado estranheza em alguns por um possivel problema de identidade, ja que UP pode ser visto como muitos filmes ao mesmo tempo (como o filme de aventura nonsense, como um forte drama e como uma ‘comédia textual’ das mais bem feitas), e todas estas facetas tomam a tela completamente alguma hora, meio que ‘apagando as demais’.
Mas não deixa de ser incrível assistir uma animação que é emocionalmente tão realista e não poupa as crianças disso, mostrar coisas completamente nonsenses, como um senhor que adestra chachorros que transmitem sons por sua coleira (ou seja, “falam”) e cenas que utilizam bem um dos alicerces motivacionais da animação que é a criação de cenas e movimentos estilizados, impossíveis de reproduzir em filmagem convencional (como a maneira que Carl criança cai da tábua, ou toda a construção de movimento das cenas onde o cachorro Dug aponta para alguma direção, só para citar os exemplos mais visíveis e simples). E é curioso como um filme que ao mesmo tempo que trata de um tema extremamente adulto e sério, dá lugar a detalhes de humor bem contrastantes, vamos dizer assim, como o lance da voz do cão ou piadinhas que chegam a ser inacreditáveis de ‘tão ridículas’, mas que usadas no momento certo, se tornam verdadeiras pérolas cômicas (o “deixa que eu paro eles” do Dug que o diga..).
Abrindo só um espaço sobre os cachorros falantes, é triste ver que muita gente não entendeu bem a proposta cômica deles, o fato deles “falarem” e como o fazem é uma brincadeira muito interessante com o conceito de “inteligência artificial” (ps: o que a coleira transmite é comunicado pelos cachorros, mas não deixa de ter um ‘aspecto robótico’ onde reside a comicidade da idéia), isto está na entonação das vozes, em como eles falam e ‘até mesmo/principalmente’ no..ESQUILO!, brinca com a aplicação da IA onde por mais perfeccionista que são os robôs em sua tentativa de parecerem inteligentes, eles ainda não deixam de agir feito idiotas do ponto de vista do que se espera quando realmente julgamos os objetos como “pensantes” (alie a isto o fato dos animais serem considerados seres irracionais num conceito generalizado e temos uma relação interessante).
O novo trabalho da Pixar, e dirigido por Pete Docter (de Monstros S.A.), inegavelmente lembra os filmes de Hayao Miyazaki (especialmente pelo fato de Miyazaki adorar ambientar suas histórias em abientes aéreos, e pelo próprio filme Porco Rosso em si que tem elementos parecidos), esta impressão fica extremamente reforçada por causa da belíssima trilha sonora de Michael Giacchino que lembra muito o estilo do compositor Joe Hiasishi que fez a musica de todos os filmes de Miyazaki, pelo tom “bizarro” que o filme “assumidamente assume” por causa de elementos como ‘balões levitando casas’ ou ‘humano com um exército de cachorros adestrados’ e também por ser uma fábula sobre o crecimento de seu protagonista através de sua interação com os demais personagens, idéia que muito me remete a obras como O castelo animado e O serviço de entregas da Kiki. Mas falando do ‘tal humano’ chegamos ao vilão do filme, esta que é a parte que mais pode desagradar, e se voce não gostou de algo no filme anterior a isso pode ser o ponto crucial para te irritar.
O personagem nada mais é do que um insano que quer a todo custo alcansar seu objetivo e não é desenvolvido hora alguma, talvez pela introdução do filme nós temos a impressão de que ele é uma grande pessoa ja que impulsionou a vida de Carl e Ellie da forma como ela foi, mas o interessante nesta história é o fato de tal personagem nunca ter sido demonstrado como ‘bom’ já que o que vemos dele anteriormente são apenas notícias e sua faceta mostrada pela mídia, certamente ele sempre foi o sujeito insano e egoísta mostrado ao fim da película, mas sua falta de desenvolvimento atrapalha o resultado já que ele parece um personagem desalmado, um pedaço plástico que inegavelmente tem sua função no resultado final (ja que sem ele parte do sentido do filme se acabaria), mas acaba parecendo uma solução fácil para se chagar em tal objetivo que seria a ultima peça do quebra cabeças. Mas também precisamos considerar que um grande desenvolvimento do personagem exigiria mais conteúdo na película o que poderia tirar dela o seu foco que não se perde hora alguma no resultado final, fora que vilões “puramente maléficos” já são tradicionais tanto no cinema ‘quanto e’ principalmente nas animações (os clássicos Disney que o digam).
O que vejo de legal da Pixar é a extrema habilidade que eles tem de logo de cara fazer o publico se importar com seus protagonistas, em pouco tempo em cena os personagens principais nós já pegamos o gosto em vê-los, de presenciar seus movimentos, e nisto reside o principal problema do vilão que não causa simpatia alguma (e isto nada tem a ver como ele ser de fato o vilão, personagens como Randall e Síndrome estão aí para provar).
Falando de aspectos cinematograficos, UP é vigoroso. Suas cenas são de uma contrução narrativa fantástica, desde o prólogo onde ele diz tanta coisa sobre seus personagens e sobre o passar do tempo mesmo com tão pouca duração, indo até como o filme se comporta desenvolvendo a aventura de Carl e as particularidades de cada situação, tudo é brilhantemente conduzido e com muita identidade. Falando tecnicamente, é perfeito, tanto pelo trabalho de fotografia, edição, design de produção e chegando ao melhor de seus aspectos, sua incrível trilha sonora que por si só já é apaixonante e muito bonita, e se encaixa como uma luva com o filme e suas imagens.
O uso do 3D foi dispensável. Como ja me alertaram e eu enfim pude ver, neste filme o 3D é apenas um elemento embelezador da experiência pois muitas das cenas o efeito fica apenas no básico e em outras você até esquece da profundidade, tudo é completamente diferente do que falei sobre Monstros vs Alienigenas por exemplo onde o filme parece que foi CONSTRUÍDO para a exibição 3D e não transportado para ela, portanto assistir em 3D ou não só vai mudar a sua experiência por causa de detalheszinhos mesmo, ver em 3D nem vai enriquecê-la tanto assim, mas em compensação virão outros filmes por aí que prometem usar o recurso 3D de forma absurdamente boa, como Avatar e Os fantasma de Scrooge (o nome escroto que resolveram adotar aqui no brasil para A Christmas Carol…)
UP fala de temas muito delicados, e que o público adulto facilmente irá se identificar, o que não tira o seu brilho como um filme que pode ser facilmente apreciado pelo público jovem (coisa que a Pixar sempre fez e tem em Ratatouille, seu melhor exemplo recente) embora aqui, acima de qualquer outro filme do estúdio, os pequenos não estão como o público alvo ao lado dos adultos, mas ainda poderão apreciar o filme. Tais temas são coisas como a inevitabilidade da morte, conquista, superação dentre outras que prefiro não falar em respeito a quem ainda não assistiu, é um filme alegre na mesma medida que é triste, basta ver que tudo o que se move na vida de Carl a partir do fim do ‘prólogo’ se deve a todas as coisas que ele dava valor e se perderam com o tempo (inclusive o seu terreno).
Up tem o principal ingrediente de todo e qualquer grande filme, ele inicia-se de dentro de seus personagens e por suas emoções de forma que assim já nos conecte a sua vida e assim à sua aventura, o que dá muito mais valor ao que acontece em cena. é centrado na emoção e isto é um feito que ganha contornos de destaque quando estamos numa era onde o cinema cada vez mais se centra em formulas prontas e que visam o lucro fácil como a onda de remakes e filmes baseados em algum produto popular que gere automaticamente um ‘público garantido’ (fruto da triste situação econômica da indústria cinematográfica), principalmente no chamado “cinemão hollywoodiano”. Então UP acaba se tornando uma estória belíssima sobre seu protagonista e como ele cresceu no decorrer do tempo onde a história principalmente se passa, um filme que irá lhe emocionar por sua sinceridade.
Carl e seus balões ja são uma imagem inesquecível.
Nota: 9,0