Além de números malditos e monstros de fumaça
Bom, a coluna da semana passada não teve lá grande audiência, mas como eu sou aficionado por Lost, to me lixando pra isso e vou continuar tagarelando sobre. 🙂
Mas o que me deixa mais interessado em acompanhar as aventuras de Jack e sua turma é mais do que seus mistérios. O que mais me impressiona é a capacidade dos roteiristas criarem um imenso quebra cabeças que aos poucos vai se montando e mostrando a história como uma coisa só ao fim de tudo. Quem são aqueles personagens, de onde vieram e para onde vão, tudo vai sendo mostrado em doses homeopáticas, colocando cada pecinha em seu lugar, deixando um lugar vago em local estrategicamente escolhido, e quando esta peça é finalmente colocada, faz o painel ganhar sentido.
Então eu humildemente me proponho a criar uma pequena analise da trajetória dos principais personagens da série.
Cirurgião de renome foi a Austrália buscar o corpo do pai, que morreu em uma viagem ao país. Jack tem como base de sua personalidade a necessidade visceral de encontrar uma explicação para tudo, assim como manter todas as situações sobre controle e tentar consertar qualquer coisa. Essa atitude o levou imediatamente, a revés de sua vontade, a assumir o posto de “líder” entre os sobreviventes do vôo 815. Jack organizou cada um dos sobreviventes, decidiu como iriam sobreviver e delegou tarefas. Logicamente sua posição logo o fez ganhar inimizades e antipatias, como a de Sawyer e Locke.
A cisma de Jack em assumir responsabilidades imensas vem do fato que ele salvou Sarah (com quem vem a se casar futuramente), que após um acidente de carro não tinha mais chances de caminhar novamente. Mas após uma complicada cirurgia, Jack consegue impedir a paralisia de Sarah, e todos passam a ver isso como um milagre. O renome de Jack ganha grandes proporções e pessoas o buscam como um salvador.
Essa responsabilidade jogada nele passa a ser comum, também a revés de sua vontade, mas impulsionada pela sua necessidade de consertar as coisas. Isso chega ao limite nas vésperas do acidente que o leva até a ilha, quando seu pai, Christian opera uma mulher estando sob o efeito de álcool, e Jack intervém. Porém o filho não consegue consertar o erro do pai, e a mulher morre. Jack não consegue mentir para protegê-lo e acaba por entregar Christian. A necessidade de ser o mais útil possível também acabou com seu casamento, pois ele não tinha tempo para Sarah.
Na ilha Jack é o mais empenhado a fazê-los sair. Sempre se colocando ma frente do fogo cruzado, foi alvo dos Outros, operou Bem Linus e em uma manobra de mestre salvou a vida de Sawyer e Kate. Entre outros, salvou a vida de Charlie, mas não conseguiu salvar a de Boone, o que o deixou terrivelmente abalado.
Jack conseguiu contatar resgate (que não era exatamente resgate) e depois de muitos percalços acaba por conseguir deixar a ilha ao lado de Kate, Sun, Sayid, Hurley, Lapidus, Desmond e Aaron. De volta ao mundo “real” ele ainda mantém a postura de líder. Ele convence os demais sobreviventes a mentirem sobre tudo, para proteger aqueles que ficaram na ilha de novos ataques. Assim Jack tentou seguir sua vida, ao lado de Kate, mas novamente o médico foi incapaz de manter um relacionamento, agora com a sombra de Sawyer, da culpa de ter deixado seus amigos na ilha, do fantasma de seu pai e da descoberta que Claire é sua irmã. Jack vai se deteriorando até acabar viciado em remédios e obcecado em reencontrar a ilha.
Chegando a quinta temporada começamos a ver as mudanças na personalidade de Jack. O homem que sempre se apegou a racionalidade e necessidade de manter tudo sob seu controle vê que o mundo faz as coisas por si só, independente de nossa vontade. A fé que ele até então renegava começa a nascer no herói, que enfim se agarra à necessidade de salvar aos que ama. Ele por um período de tempo até mesmo aceita se submeter ao comando de Sawyer, mas apenas até o momento que encontra o seu objetivo, e uma coisa que ele sempre negou existir: seu destino.
Kate sofreu muito na vida nas mãos de um padrasto abusivo e de uma mãe submissa a ele. Longe do pai, um soldado do exército americano, ela viu como sua única saída dar cabo de vez do seu carrasco. Kate explodiu a casa onde morava com o padrasto dentro, apenas para descobrir depois que ele era na realidade seu pai biológico. Kate foi denunciada pela própria mãe, e a sardenta passa a ser perseguida pela policia.
Ela se torna então uma fugitiva. Não consegue se prender a nada nem a ninguém.
Sempre com um nome falso, uma aparência diferente, ela tenta novos relacionamentos, mas sempre são impedidos pelo medo que Kate tem de ser descoberta e presa. Ao tentar encontrar com sua mãe as portas da morte, com a ajuda de seu namorado de infância, Tom, eles acabam sendo perseguidos e Tom é morto na fuga. Kate se abala de vez e passa a se ver como uma sombra de morte para todos que se aproximam dela.
Assim ela vai para a Austrália em fuga, e é ajudada por um fazendeiro, que acaba por denunciando-a em troca de uma recompensa. Ao tentar fugir o fazendeiro se fere gravemente e Kate tenta salva-lo, o que impede sua fuga e ela acaba sendo levada pelo agente federal que a persegue. Encaminhada a América eles pegam o vôo 815 da Oceanic Airlines, que a leva para a ilha. Na ilha Kate demonstra sua incapacidade de se abrir, de se envolver, ao tempo que se interessa por Sawyer e demonstra ter sentimentos por Jack. A duvida que se forma no triangulo jamais é sanada, pois Kate não se permite envolver profundamente, visando sempre mais se embrenhar em missões perigosas pela ilha do que se permitir conhecer melhor seus dois pretendentes.
Quando saem da ilha, Kate tem Aaron em seus braços. Pela primeira vez ela sente que tem alguém. Fora da ilha a sardenta luta com todas as suas forças para manter seu “filho” ao seu lado, batendo de frente com a justiça e até mesmo com Jack. Porém Kate se dá conta que se apegou a única coisa que não a pertencia e, num ato de total arrependimento, decide voltar à ilha em busca de Claire. Kate finalmente achou algo pelo que se prender, e pelo que lutar além de si mesma.
Obs.: só pra quem já viu a terceira temporada, achei basbaquice a Cassidy dizer que Kate se apegou em Aaron como um consolo pela perda de Sawyer – a personagem e suas carências são muito maiores que isso.
Nascido James Ford, o garoto viu seu pai matando sua mãe e se matando logo depois. Isso porque a mãe de James foi seduzida por um homem chamado Sawyer, que destruiu sua família e aplicou um golpe em seu pai. Sabendo do que houve o jovem James escreveu uma carta ao golpista, prometendo que se vingaria. James cresceu e adotou o pseudônimo do algoz de seus pais, e não só isso, seu estilo de vida. Sawyer passou a. duvidar da bondade humana, e de sua própria. Criou uma casca dura, impenetrável, de um homem desprezível. Passou a viver a margem da sociedade, e foi parar na prisão, onde também se valeu de um golpe, em um de seus colegas de cela, para sair dela. Sawyer renegou a filha que teve com Cassidy, mas se mostra visivelmente abalado por isso. Enganado por um comparsa ele vai até a Austrália e executa a sangue frio um homem que ele acredita ser o verdadeiro Sawyer, mas era apenas um inocente que devia dinheiro ao seu comparsa. Ao se envolver em uma briga de bar é deportado para os Estados Unidos, no vôo 815.
Ele tem a chance de realizar seu destino ao matar o verdadeiro Sawyer, que na realidade é o golpista Anthony Cooper, pai de Locke.
Na ilha ele se torna o nemesis de Jack. Avesso às decisões do médico, e demonstrando um egoísmo impar, ele consegue a antipatia quase geral dos sobreviventes.
Seu relacionamento com Jack vai da total antipatia à parceria incondicional. Sawyer, por mais relutante que seja, sabe que Jack é um homem integro e bem intencionado, e deve seu vida ao doutor por mais de uma vez. Porém sua personalidade rebelde o faz bater de frente com o médico com muita freqüência, ainda mais incentivado pelo sentimento forte que nutre por Kate.
Mas seu lema de que “um tigre não muda suas listras” logo vai se esvaindo, pois apesar de atitudes altamente cruéis, como simular um ataque a Sun para tomar as armas que haviam encontrado para si, as mazelas em que vão se envolvendo acabam desconstruindo o bad boy e revelando um herói relutante sob a carcaça.
O ápice de seu altruísmo se dá quando, finalmente com a chance de sair da ilha, ele salta do helicóptero, permitindo que Lapidus tivesse combustível suficiente para levar seus amigos para longe dali. Sawyer acaba se tornando o líder dos remanescentes na ilha, e na quinta temporada parece finalmente ter encontrado a paz da qual sempre se manteve afastado, em uma nova vida, ainda que de mentira, é a mais honesta que teve desde sempre.
É isso aí, pessoal… Sei que o post ficou imenso, mas não consigo ser sucinto quando falo de Lost. Semana que vem, sim, tem mais. Quero tentar criar um grande painel do que essa série significa para mim e espero que gostem.
Um abraço e até o próximo episódio.