Smallville estreou em 2001 com a promessa de contar as desventuras do garoto de aço numa fase da vida que nunca conhecemos do Superman. Era um campo que nunca fora devidamente explorado, e isso abria aos roteiristas uma gama de possibilidades muito grande. Por que ele resolveu se tornar o samaritano supremo? Como ele se tornou um herói? Qual a criação que seus pais lhe deram? Ele sempre foi o “escoteiro” que conhecemos? De onde veio sua rivalidade com Lex? Por que decidiu ser repórter? Por que ele usa a cueca por cima das calças?
Com todos esses caminhas a serem seguidos, o programa tinha uma boa chance de ser um sucesso. E é. Smallville está no ar há 7 anos e ainda promete mais temporadas, com uma pequena legião de fãs. A qualidade? Bom, aí já é outra história.
Começaram bem, sem dúvida. O episódio inicial apresente um vilão bacana, uma trama interessante, a gama de personagens coadjuvantes legais (com destaque para Chloe e Lex Luthor). Mas logo os roteirismos tomaram conta da série. Smallville, a cidade interiorana mais bizarra dos EUA (talvez empatando com Sunnydale) logo ficou abarrotada de “kripton-freaks”. Toda a semana um adolescente qualquer tinha contato com kriptonita a ganhava um poder bizarro – e este adolescente era sempre mal/louco/obssessivo. Os poderes foram de imortalidade, capacidade de mudar de forma e controlar o fogo até sugar a gordura das pessoas. Em pouco tempo a sacada de usar a kriptonita como “desculpa” para o vilão da semana virou rotina. O moleque ganha poder – rapta um amigo ou parente de Clark – Clark surge em resgate – o local é cheio de kriptonita – o ente querido desmaia antes de ver Clark usar seus dons – o vilão morre. Mais receita de bolo que isso, só Power Rangers.
Lógico que a série teve seus méritos. Os Kents boa-praça, a personalidade ambígua de Lex, sua relação com Lionel, as citações a mitologia do Superman.
Esses roteirismos usados a exaustão depreciam a qualidade da série. Saídas fáceis. Esse uso começou a se espalhar por todos os episódios. Os kritpon-freaks eram deixados de lado, e em sua substituição vinham kriptonitas multicoloridas com diferentes efeitos no Clark ou participações especiais de outros personagens DC Comics. A desculpa para trazer os personagens era o de menos. O importante era tê-los, mesmo que com episódios pífios. É o contrario das participações que citei semana passada, em Friends. Ao invés das tramas pedirem essa participação, a trama é escrita em torno da participação do personagem, o que não é nada bom, até mesmo porque todas as participações tinham a ver, sempre, com a LuthorCorp. Será que faltava um pouco de criatividade no lance? E as kriptonitas usadas em todas as coisas na série – Alguma coisa estranha acontece na cidade? Kriptonita sempre é a resposta. Seja pra criar mutantes, fantasmas, vampiros, bruxas, terremotos, inflação…
Falando em fantasmas, que tal os trocentos poderes de Lana Lang? Eça já foi bruxa, vampira, médium, vidente, teve os poderes do Clark um par de vezes…
O status quo inabalável de Smallville é outro fator negativo. Exemplo? No final da quinta temporada, o espirito do zod (???) encarnou no lex, que saiu tocando o terror em Metropolis. Depois o espirito é exorcisado (padre Merrim, alguem?) e o Lex sai da historia lépido, faceiro e ileso. Imagino ele explicando pra policia: “-Desculpa gente. é que tinha um espirito kriptoniano encarnado em mim e eu não controlava minhas ações.”
Situações quase idênticas acontecem com frequência – como um garoto que controla insetos e uma menina que controla abelhas. A falta de coerência dos enredos foi disfarçada com a aura pop, atores e atrizes saradinhos e efeitos especiais nem tão especiais assim.
Mas eu deixei a cereja do bolo para o final: e o Jor-El? Jor-El foi a galinha dos ovos de ouro pros roteiros furados de Smallville. O cara morreu. Bateus as botas. Foi pro bico do corvo. Mas ainda assim, além de conversar ao vivo com todo mundo, o cara pode matar ou dar superpoderes pra quem ele quiser, voltar o tempo, mudar o clima, prever o futuro, teletransportar pessoas… então, se o roteirista quer fazer a maior lambança, sem problema. Jor-El estala os dedos e tudo se resolve. It´s alien magic. We don´t have to explain it.
Em suma, não critico o fato do seriado ter modificado a mitologia do homem de aço. Isso é irrelevante. A minha critica se baseia em seu valor único como SERIADO. Roteiros ruins, uma falta de ruma total, acontecimentos aos trancos e barrancos, argumentos beirando – e ultrapassando – a fronteira do ridículo.
Smallville pode até ser divertidinho as vezes. Mas em uma época de séries como Lost, espera-se muito mais.
Moura em Série
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Smallville – Boa idéia. Péssima execução.