Uaréva! Uaréview Uaréview: Corra!

Uaréview: Corra!


Construir terror com situações tidas, até aquele momento, como puramente ideológicas, sociais, até corriqueiras não é um trabalho fácil. É de se admirar quando um autor consegue pegar uma questão de nosso cotidiano e gerar a partir dela uma obra interessante, esse é o caso do recente filme lançado Corra!

Sinopse: Chris (Daniel Kaluuya) é jovem negro que está prestes a conhecer a família de sua namorada caucasiana Rose (Allison Williams). A princípio, ele acredita que o comportamento excessivamente amoroso por parte da família dela é uma tentativa de lidar com o relacionamento de Rose com um rapaz negro, mas, com o tempo, Chris percebe que a família esconde algo muito mais perturbador.


Get Out, o título em inglês, deve ser uma das ideias mais fantásticas do cinema de suspense/terror dos últimos tempos. Combinando a questão racial tão presente nos noticiários, conversas e cotidiano atual ele problematiza e expõe o famoso racismo enrustido numa sociedade elitizada, ou o famoso “não sou racista, tenho até amigos negros”.

Temos aqui demonstrações excessivas de compreensão por parte da família branca para com os problemas negros; exemplos estereotipados de negros de sucesso, o costume de “tratar” empregados negros como “da família”, em seu discurso e construção de cenário o filme nos apresenta exatamente aquilo que a comunidade afro se depara todos os dias.

O grande pulo do roteiro é explorar isso indo além e criando uma situação bem ao estilo hitleriano de ser, inclusive é gratificante ver as pequenas referências no primeiro ato a como por debaixo daquela fachada a família da namorada de fato não gosta de negros. Acompanhamos a tensão que Chris vai sentindo a medida que estranha tudo e começa a ver sinais estranhos.

O clima de suspense do filme é muito bem construído pelo roteirista, diretor e comediante Jordan Peele. Infelizmente, Peele fraqueja quando finalmente vamos para terror e o terceiro ato entra em cena. Ao invés de explorar mais a linguagem do gênero, a lógica de tortura psicológica, rapidamente corre, desculpa o trocadilho, para uma ação clichê e previsível.

Filmado no Alabama em apenas 28 dias, o filme teve um orçamento de US$ 4,5 milhões e só no fim de semana de estreia nos EUA já tinha arrecadado US$ 33,3 milhões. Um fenômeno que dá um bom respiro no gênero e leva para um outro tipo de público a reflexão sobre como o negro é tratado em uma sociedade claramente preconceituosa e que vive constantemente buscando novas maneiras de explorá-lo.

Nota:  8.5

Jornalista, Mestre em Comunicação, autor dos livros O Maior Espetáculo da Terra (Editora Penalux, 2018), MicroAmores (Escaleras, 2020) e Grãos de Areia (Urutau, 2022)

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